Science as Labor

Sessão de 27 Novembro 2008, Júlia Gaspar.

LEFÈVRE, Wolfgang,
"Science as Labor",
Perspectives on Science, vol. 13, no. 2, 2005, p. 194-225


O termo tecnociência é usado com dois sentidos, um mais alargado outro mais restrito. O primeiro refere-se ao emaranhado intricado da produção científica e económica que se desenvolveu a partir do século dezanove e caracteriza hoje o processo social da produção no Ocidente. A produção da alta tecnologia moderna não se baseia só na ciência mas assenta na ciência que se tornou possível graças ao desenvolvimento destes processos científicos avançados, ou seja, é por seu lado suportada pela produção de base científica.

No sentido restrito tecnociência designa ciências que são um verdadeiro híbrido representado pelos processos de produção científicos e normais. Ao mesmo tempo que incluem os processos tecnológicos inerentes à respectiva ciência experimental produzem literalmente os objectos que estudam. São exemplos a química moderna e campos da física como a física das partículas.

O texto procura resposta para duas interrogações. O carácter tecnocientífico da ciência é óbvio no caso das ciências que produzem materialmente os objectos que investigam, mas poderá este carácter estender-se, de forma generalizada a toda a ciência?

Será possível detectarmos novos traços da sua prática, das suas pré-condições, das suas dinâmicas e talvez até da sua dimensão cognitiva, se olharmos para a ciência em geral à luz da nossa experiência actual de penetração mútua de ciência, tecnologia e produção normal?

A resposta do autor pressupõe concepções que transcendem as habitualmente aplicadas nos estudos sociais da ciência em que o estudo da sociologia está divorciado do estudo da economia. Por isso Lefèvre recorre aos termos e às categorias da teoria sociológica de Karl Marx. Assim, a ciência é considerada como factor do processo de produção que se tornou tão importante como o acesso a matérias-primas, contudo a ciência tem condicionamentos específicos. As descobertas e inovações não podem ser previstas ou planeadas, a ciência tem um carácter aberto, e os custos elevados que a ciência comporta retiraram o seu controle da iniciativa privada, mais interessada em empreendimentos lucrativos. Assim tornou-se indispensável um gigantesco sector de ciência e tecnologia, tanto nos países de iniciativa privada como nos de economia socialista. Como resultado de interacções complexas de longa duração entre todos os parceiros sociais envolvidos – comissões políticas constitucionais, agências de serviço público, forças armadas, associações de companhias comerciais e industriais, assim como instituições para a ciência e tecnologia tradicionais ou recém-formadas – foi desenvolvido e continua a desenvolver-se um sistema intricado de locais de investigação e formação científica formalmente independentes, semi-dependentes e controladas directamente. Estas redes institucionais representam a forma social da ciência e constituem uma parte do processo social do trabalho.

A relação entre ciência e produção económica caracteriza-se por uma ligação estreita, não de sujeição simples da primeira em relação à segunda, mas antes uma dependência, em que a esfera da produção económica é uma condição essencial para a existência da ciência. Mas esta relação entre os benefícios dos dois lados é assimétrica no período com início na época moderna até à Revolução Industrial. Esta Revolução foi um ponto de viragem. Entre 1500 e 1800 a contribuição da ciência para o desenvolvimento da produção económica era modesta, embora vários sectores pudessem usufruir do conhecimento adquirido cientificamente. Com a Revolução Industrial a assimetria da relação entre ciência e produção económica começa a ser lentamente substituída por uma relação material complexa de mútua dependência, embora a esfera da produção económica tivesse mais importância para a ciência como fonte rica de materiais, instrumentação, inspiração, conhecimento e experiências. Também foram importantes as relações do comércio internacional, com particular incidência nos sistemas coloniais construídos desde o século dezasseis pelas nações europeias. Dos processos artesanais até à high-tech a dependência da ciência da produção económica tornou-se cada vez mais profunda. Em contrapartida a base científica da produção industrial também se alargou.